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“Rita, não grita!” Falando sobre birras e suas consequências

18 março, 2013, Paula Saretta Dicas de livros infantis 4


“Rita, não grita!” Falando sobre birras e suas consequências

POR Paula Saretta e Milena Aragão*

“Ah! Isso é bobagem, é birra, nem dou atenção! Levanto do chão com um tapa e ele para logo!”

Ah [suspiro]… a questão das birras! Quanta dor de cabeça para os pais! E quando ocorre no meio do shopping? Aí piora, afinal, todo mundo olha e espera uma reação sua! O que fazer? Bater? Ignorar? Pois bem, vamos pensar um pouco sobre o que as birras querem dizer!

Birra é um nome dado a um comportamento esperado da criança que está em fase de desenvolvimento, adquirindo autonomia e independência.

Veja, quando seu filho era um bebezinho, ele não podia caminhar e era quase que completamente dependente de você. Então ele aprende a engatinhar, depois a caminhar, a alcançar as coisas que deseja, a desenvolver cada vez mais a linguagem, a explorar o mundo… Na cabecinha dele, ele pensa: “Opa! Sou forte! Consigo correr! Consigo subir escada! Eu consigo fazer muitas coisas! Não sou mais um bebezinho, sou uma criança grande!”. Só que quando esse desejo por autonomia esbarra em muitos “nãos”, a capacidade de gritar e espernear é apresentada com maestria! Ou seja, a birra é uma forma da criança reagir às restrições postas à sua necessidade de exercer independência e autonomia. Assim, o método que ela utiliza para mostrar  sua frustração é o que conhece desde bebê (e que sempre deu certo para ela, inclusive!): chorando e gritando!

Mas, então, o que fazer numa situação de birra? Ensinamos e almejamos crianças que ajam de acordo com o que entendemos por comportamentos socialmente desejáveis, como respeito ao próximo,  esperar a vez para falar, aceitar as frustrações sem gritaria, etc.. E quando isso não acontece, o que fazemos? Geralmente encarnamos rapidamente a mãe-professora-brava e começamos a dar broncas  e repetir ameaças e mais ameaças, não é? 

Entender as consequências do meio social para suas ações indesejadas pode ser algo bem mais eficaz do que as broncas e ameaças constantes. Assim, as perdas, seja do carinho da mãe, da amizade dos colegas, de momentos de brincadeiras entre irmãos, etc.., que estão sempre implicadas nos momentos em que a criança se mostra sem limites e com uma tolerância muito baixa, são ótimos e poderosos motivos para que elas mudem seu comportamento.

Um livro excelente para conversar sobre tudo isso com os pequenos birrentos foi escrito pela pedagoga Flávia Muniz, em 1985, mas já reeditado algumas vezes pela Editora Melhoramentos, chama-se “Rita, não grita!”. No livro, Rita “magrela e tagarela” (páginas em destaque acima) é uma menina que grita para tudo, faz birra o tempo todo. Por conta disso, os colegas da escola resolvem sair de perto dela, todas as vezes que ela se comporta assim. Sem ter “para quem gritar”, Rita começa a perceber que pode resolver seus problemas e frustrações de outro modo, com graça e conversa.

Sabemos que quando a criança tem a oportunidade de resolver seus problemas, elas se sentem competentes, ganham mais auto-confiança e aprendem a fazer escolhas mais responsáveis.

Sabemos também o quanto é complicado ceder sempre que a criança chorar por algo. Mas, de novo nos perguntamos, o que fazer, então? Antes de mais nada, pense um pouco na seguinte questão: o que é negociável e o que não é negociável para você? Uma sugestão seria explicar o que se passa em sua cabeça, com firmeza e tranquilidade, com a intenção de dizer “entendo que você queira decidir as coisas e você pode decidir algumas coisas, mas não tudo”.

Tem também aquela birra mais escancarada – que impossibilita inclusive de ter um diálogo com seu filho, já que a altura dos gritos e choros impedem qualquer comunicação. Neste casos, a ação de retirar a criança do local rapidamente e levá-la a um outro lugar mais tranquilo, para que todos se acalmem, parece uma ótima ideia. Uma outra sugestão (quase infalível!) é traduzir o sentimento dela, isto porque elas ainda não conseguem nomear e discriminar seu próprio sentimento para poder aprender a se auto controlar.

Sim! A criança também sofre nesse momento. Assim, é importante ensinarmos à ela a lidar com as suas emoções e a resolver conflitos de forma positiva. Ora, se dizemos que gritar é errado, então porque usarmos esse método para educá-la?

Então, não perca tempo gritando ou dando lições de moral, a criança pequena não entende sequer o que está sentindo, ela ainda é muito imatura emocionalmente. Quer que ela ouça você? Tente falar menos!

Ah! Mas a melhor sugestão, sem nenhuma dúvida, é: “conheça e ouça o que seu filho está tentando comunicar!”. O ditado “criança não tem querer” realmente não é apropriado! Ela tem querer sim, ela está em desenvolvimento, ela tem gostos e vontades que às vezes diferem das nossas e precisamos ouvi-la. A birra não é apenas manifestação de teimosia, ela é, também, manifestação do desenvolvimento, da independência, da autonomia que seu filho gradativamente experimenta. Ela quer participar do mundo e escolher o que ele tem a oferecer. Então, quem sabe comecemos, nos momentos de birra, a ensinar os nossos filhos a escolher sadiamente e a entender suas emoções e sentimentos?

Querem um resumo bem rapidinho? Fale sobre os sentimentos envolvidos na situação (seu e dele), diga “não” quando necessário, negocie quando puder e mantenha a calma! Entenda a birra como parte do desenvolvimento infantil e aproveite o momento para belos ensinamentos!

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* Paula Saretta é psicóloga. Doutora em Educação pela Unicamp. Mestre em Psicologia Escolar pela PUC-Campinas. Aperfeiçoada em Queixa Escolar pela USP. Formadora de professores e Consultora em Psicologia e Educação. Fundadora do site/blog Ouvindo Crianças.

Milena Aragão é psicóloga. Mestre em Educação pela Universidade de Caxias do Sul/RS e Doutoranda em Educação na Universidade Federal de Sergipe.

 

 

 

  • Rosana Cristina Dias Aragão

    Nossa! Adorie! Deu até vontade de ter outro filho, já que voltar atrás é impossível! (rsrsrs) Enfim também não posso mais ser mãe! Mas, fico feliz ao ler um texto tão farto de conteúdo e amorosidade capaz de orientar os pais e responsáveis – e também familiares- sobre como respeitar uma criança em seu desenvolvimento e, por conseguinte, propiciar aos pais que olhem para si mesmos e se reconheçam como seres em desenvolvimento capazes de amar.

  • Ana Carolina Moura

    Na teoria o texto é ótimo! Mas não respondeu à pergunta: e se eles fazem isso em público, no meio do shopping, se joga no chão, chora, grita, esperneia. A mãe sozinha com a criança fisicamente não dá conta pra tirá-la do chão. Conversar é inútil, e se fosse na época dos meus pais eles realmente levantariam a criança com um tapa na bunda e ainda receberiam olhares de aprovação. Agora tudo é politicamente correto e qualquer coisa é motivo pra conselho tutelar. Será que por isso mesmo não vemos cada vez mais cenas de crianças dando verdadeiros shows em público e exigindo o que querem?! Elas estão tão acostumadas a poderem decidir tudo porque são ouvidas o tempo todo que não sabem receber um não! E como os pais lidam com isso? De verdade em uma situação prática de birra intensa, o que faz essa mãe?!

  • Denise Guilherme

    Paula, mais uma vez, super bacana. Gosto dos seus textos porque não dão receitas, mas provocam a reflexão. E isso é muito importante.
    Nossos pequenos nos colocam em constantes desafios porque nos mostram que a vida exige presença. E eles clamam por isso.
    Manoel está bem nessa fase. Às vezes, consigo me conectar e nomear os sentimentos dele, acalmando-os. Às vezes, sinto-me desafiada a impor limites e dizer até onde ele pode ir com suas vontades. O equilíbrio entre essas duas posturas é difícil.

    Por outro lado, achei interessante essa questão do exemplo do shopping que vc cita. Quando o Manoel faz isso em público, geralmente fico mais incomodada com as expectativas que eu acho que as pessoas têm do que deveria ser uma boa mãe do que com a situação real da birra. É como se eu devesse satisfação a elas sobre a educação do meu filho. E isso gera uma necessidade de resposta a uma demanda que, muitas vezes, nem tem relação com a situação em si.
    Nessas horas, quando consigo, relembro meus tempos de professora e toda a experiência de vida que acumulei vendo que isso aconteceu com meus alunos, meus sobrinhos e filhos de amigos. E que isso passa.
    O que não passa, muitas vezes, são as lições de ameaças, violência verbal e física. Elas ficam ali guardadas como registro de que é preciso esconder o que se sente, para não correr o risco de deixar de ser amado.
    E dá-lhe terapia…srsr Vc sabe bem disso.
    Beijos e obrigada.

  • Veronica Esteves de Carvalho